Min-max no RPG

Um dia desses, fui convidado pra participar de uma mesa de RPG de um amigo. Ele tá super empolgado com a história, então parece que vem coisa boa por aí.

Ele decidiu narrar a história usando o sistema Ordem Paranormal, que ele gosta bastante. Não conheço muito do sistema, então vou restringir minha opinião a apenas: muito detalhe que ora me dá sono 😪, ora me deixa tonto 💫

Durante a criação da minha personagem, na parte de escolher equipamento, senti um desconforto, mas não soube expressar. Então chegou a vez de outro jogador criar o personagem dele, e só aí eu entendi o que era o desconforto: minha personagem estava fraca, igual a uma vareta, tinha pontos que não usava e não estava do jeito que eu gostaria. O personagem do coleguinha, por outro lado, estava sensacional. Saiu como ele queria, forte e conseguiu extrair o máximo dos pontos que tinha.

Por quê? O min-max!

O que é min-max?

Min-max é o nome dado a estratégias que visam minimizar perdas e maximizar ganhos. Ou seja, você tenta gastar o mínimo de recursos que o sistema te fornece (seja durante a criação de personagem, seja durante o jogo) e tenta conseguir o maior resultado possível.

Durante a criação de personagem na nossa mesa, eu tinha espaços de inventário limitados que deveria preencher com equipamentos diversos. A maioria dos equipamentos eram armas e armaduras (ataque e defesa, dano e proteção).

Minha personagem é uma menina da fazenda, então imaginei ela lutando com uma foice, montada num cavalo, bem estilo Darrow em Fúria Vermelha. Achei a foice na listinha de armas e escolhi. Peguei um escudinho também porque eu conseguiria fazer funcionar e tava pronto o sorvetinho.

Aí o narrador:

Não vai escolher nenhuma modificação pras suas armas?

Escolhi uma coisinha ou outra, insatisfeito porque nenhuma das modificações me agradou. Quase todas eram sobre dano, bônus em jogadas de ataque ou proteção extra. Emlin (a minha personagem) é uma menina de fazenda, não uma assassina bem treinada. Não era pra ela conseguir fatiar três oponentes como se estivesse cortando requeijão em barra!

Depois disso vieram várias outras mudanças, todas voluntárias, porque eu sei que o narrador só queria fazer a personagem funcionar naquele cenário. No fim das contas, eu adoro uma porradaria generalizada, então vou me divertir de qualquer forma.

E quando o outro jogador começou a criação do personagem dele, eu finalmente entendi. Ele otimizou cada mínimo detalhe do personagem, inclusive a custo da ficção. Ele não escolheu a espada porque o personagem era espadachim, e sim porque ela trazia maiores benefícios numéricos/estatísticos. Por outro lado, eu criei minha personagem pensando na ficção primeiro, depois modelando as regras de acordo. Mas o sistema esperava de mim que pensasse primeiro nas regras, e deixasse a ficção pra depois.

Por que min-max é uma merda?

Pra mim, esse tipo de jogo é ruim. É claro que tem gente que adora um number crunching¹, e tá tudo bem. É justamente pela diversidade de preferências que existe uma diversidade de sistemas. Mas eu, particularmente, não consigo entender o sentido de jogar um jogo de interpretação de papéis, onde a última prioridade é a interpretação de papéis.

Se você cria pro seu jogo uma tabela imensa de armas e armaduras em que existem equipamentos com estatísticas maiores que outros, e recompensa os jogadores pelo bom uso dessas estatísticas, então você incentiva que eles sempre tentem usar os itens de maiores estatísticas.

Qual é o propósito de existirem equipamentos de estatísticas inferiores então? Ninguém nunca vai, ou pior: pela definição de bom desempenho no seu sistema, ninguém nunca deveria usá-los, porque eles são ruins.

E quanto ao equipamento que não causa dano ou protege contra ele? Um aventureiro nunca deveria sair sem seu kit de culinária, um mochileiro das galáxias nunca deveria sair sem sua fiel toalha. Mas onde vai haver espaço pra esses itens quando claramente há itens melhores pra escolher?

Um sistema dessa natureza incentiva e recompensa apenas o modo de jogo que gera lucro ou vantagens imediatas. Cheirinho de capitalismo, né? Interpretar um personagem de estatísticas baixas, mas que consegue levantar a moral dos colegas, não oferece vantagem imediata, então não é encorajado.

E como eu desencorajo min-max?

A resposta curta é: dando aos jogadores opções que não são melhores nem piores, e sim diferentes. Tomemos como exemplo o sistema Fate. Nele, todo personagem tem direito ao mesmo número de façanhas. Elas são definidas como:

“Façanhas são técnicas, truques ou equipamentos legais que tornam seu personagem único e interessante. (…) Façanhas são áreas de excelência mais específicas; a maioria delas dá a você bônus em circunstâncias determinadas ou permite que você faça algo que outros personagens simplesmente não podem fazer.” – Fate Condensado

Fate dá ao jogador uma chance de idealizar o personagem que quiser e dar a ele uma forma de brilhar, de ser mais foda que todo mundo. O que significa ser mais foda que todo mundo, contudo, é diferente pra cada personagem. Claro que nem todo arquétipo funciona em Fate, mas te garanto que a minha menina de fazenda daria mais certo em Fate do que em Ordem Paranormal 😉

Tenho certeza que há vários outros sistemas que resolvem min-max de um jeito inteligente, e até outras técnicas que tentem mitigar o impacto negativo do min-max em sistemas que são assim por natureza. Fate é a minha experiência apenas, e eu aprendi muito com ele, então tento compartilhar um pouco disso sempre que posso.

Como eu lido com jogadores que fazem min-max na minha mesa mesmo assim?

Eu deixo! Porque no fim do dia, o que importa é todo mundo estar se divertindo. Mas talvez esse jogador se interesse mais por outros tipos de jogos, quem sabe? E talvez ele precise sentar na mesa de outro narrador pra se divertir ainda mais!

Eu tento sempre deixar claro que o objetivo de um RPG é a interpretação de um personagem. É sentir o que ele sente, viver o que ele vive, e isso inclui suas vitórias e suas derrotas, suas alegrias e suas dores. O importante não é vencer, não é explodir andróides nem aprender todas as magias que existem. O importante é ter uma boa história pra lembrar e contar depois 💋